01/08/2012

a princesa desaparecida

Era uma vez, num reino longínquo, que nunca nenhuma de vós algum dia virá a conhecer, uma princesa. Não há palavras, adjetivos ou qualquer outro tipo de gramática para descrever o quão bonita era a princesa. Não há adjetivos para descrever o quão verdes e profundos eram os seus olhos. Também não há qualquer tipo de adjetivo que nos mostre o quão bonita é a sua pele, o quão frágil e de porcelana é. Mas quero que confiem em mim e nas minhas palavras.
A princesa não vestia ouro, nem rosa, nem azul. A princesa vestia preto, tinha segredos que ninguém imaginava e medos que ninguém alguma vez conseguiria descobrir. E, na princesa, havia uma coisa bastante peculiar : ela gostava de Chá Preto. Gostava do Aroma que dele provinha, gostava do seu sabor, delicado, como ela. Na realidade, este era o único Chá que ela gostava.
Porque estou a usar o Pretérito Imperfeito? Tem uma explicação simples, mas dolorosa, que ainda hoje deixa marcas.
A minha princesa fugiu. Fugiu de mim, para sempre, penso eu. Na realidade, fui eu que a deixei fugir, com o vento. Fui eu que a deixei fugir, como uma brisa de Verão. E a princesa foi com ela, para os dias mais quentes. Pousou a sua bela coroa, feita dos mais bonitos Rubis, no seu grande trono. A coroa ainda lá continua, pousada, por cima da almofada, exatamente no sítio onde ela a deixou, esperando pela sua legítima dona.
Ainda me lembro, da nossa casinha. A casinha, sim, para onde fugíamos, no bosque, quando queríamos algum sossego e paz de espírito. Era uma casinha pequenina, de madeira, caiada a branco e com várias janelas. Não tinha muita mobília - ou quase nenhuma. Era constituída por apenas uma divisão e, nessa divisão, apenas existia um fogão, um armário, um lavatório e uma estante, cheia de livros.
Quando entrávamos, abrias logo o teu armário, ias buscar a tua caneca, que já lá tinha dentro a saqueta de chá - preto, claro. Eu agarrava logo um livro da estante e, como não gostava de Chá, deitava-me no chão de madeira a ler. E tu, depois de preparares o teu Chá fumegante, fazias o mesmo. Inspiravas o seu belo aroma. E ficávamos ali, a ler, a olhar uma para a outra; a rir, a contar piadas - a ser, essencialmente, melhores amigas.
Entro. Lágrimas escorrem pelos meus olhos, olhos vulgares, que nada de bonito têm. Escorrem pela pele da minha cara, queimada pelo sol. E ajoelho-me na velha madeira, da nossa velha casinha. Hoje, as janelas da casinha estão partidas; as suas cortinas, totalmente pretas, apesar de anteriormente terem sido brancas, tal como tu tanto gostavas; o fogão não funcionava e, a estante, essa, há muito tinha apodrecido. Os livros estavam espalhados pelo chão e algumas páginas estavam espalhadas pelo chão e comidas - pelos ratos, apostava. O teu lavatório estava todo sujo e a torneia estava arrancada. E, por fim, o armário.
Como por magia, o teu armário continuava intacto. Com a mesma pintura, exatamente no mesmo sítio. E, quando o abro, vejo. Vejo a caneca, intacta. E a saqueta de chá. 
Tudo parecia tão perfeito, tão normal! Mas não era nada disso. Não era mesmo. Aquela situação era tudo, menos normal. E chorei, chorei ainda mais. As minhas pernas começaram a tremer, a cabeça a andar à roda - e ajoelhei-me. Em contacto com a fria e velha madeira, lembrei-me. 
Unimos os nossos dedos mindinhos, em sinal de promessa. Sorriste para mim, eu sorri para ti. E o Chá acabou por entornar. Sorris - já estava quase no fim, para quê dramatizar? - A realidade, é que sempre foste assim. Prática. E, principalmente, muito agarrada às tuas coisas. Amo-te.
Lembro-me da nossa promessa, enquanto bebias o teu chá e lias o teu livro, e eu passava a maior parte do tempo a olhar para ti. Lembro-me quando quase sufocámos quando tentámos fazer uma fogueira e improvisar uma lareira, para nos aquecer dos frios de Inverno e das correntes de ar. Mas só agora percebi que o fogo não era nada. Porque tu aquecias-me o coração, a mente e a alma. Só precisava de ti para perceber, verdadeiramente, o que era a amizade. Eu queria uma amizade que me consumisse, como o fogo consume lenha.
E eu amava-te tanto! E ainda continuo a amar. E amar-te-ei para sempre, até que a minha última força se esgote. Afinal, a promessa ficou por ali. Eu deixei-te ir. Talvez porque te quisesse libertar, precisavas de seguir em frente. Precisavas de alguém melhor que eu. E eu libertei-te, porque te amo, eternamente.
E quando acordei ali, ajoelhada na madeira, percebi que tudo mudara, incluindo eu. 

2 comentários: